segunda-feira, outubro 31, 2005

Dos animais de estimação e outras histórias.

(E se de repente decidir que não quero mais animais de estimação? Nem mais chatices. E se de repente os tivermos que procurar?)

Há coisas do Arco da Velha. É o Demónio a operar. (O Demónio faz parte do operariado.) Quando certas coisas nos começam a fazer lembrar outras e mais nada. Quando penso em escadas penso naquela vista de ontem. E quando penso em almôndegas penso na minha avó.

(E se de repente passarmos a noite em claro a pensar onde estarão eles a dormir? E se não os encontrarmos? O que fazemos?)

Securas na vida e escadas com vista para o Castelo (a brilhar lá no alto). Descer as escadas com um ser inanimado a caminho de um autocarro. O olhar reprovador de um sem-abrigo. Mas só duas coisas na cabeça: uma conversa e um olhar enquanto comia azeitonas e sangrava do cotovelo. E agora os picos. E esse não saber nada.

(Quando é que nos apercebemos que já desistimos? Quando é que as viagens de carro pelos campos às dez da noite deixam de ser feitas com os olhos fora da janela?)

(sem humor, mas com outras coisas)

sexta-feira, outubro 28, 2005

Aguenta aí mais um pouco, Odete

Esta manhã fui protagonista de uma experiência que, no mínimo, pode ser qualificada de inovadora.
[Sr. Daniel Sampaio, se algum dia tiver a oportunidade de observar esta iluminada e soberba massa crânio encefálica que possuo contemplará aquilo a que muitos chamam de a “Canaã do Conhecimento”. E chorará]
De facto, durante o período matutino de hoje, enquanto o estado de latência em que me encontrava ainda me enchia de inércia de tal maneira que esta já me saltava pelos sacos lacrimais, procedi à mais arrojada e excessivamente estúpida experiência da minha vida desde que, nos idos da década de noventa, ainda no século passado, vi um episódio completo do Big Show Sic.
Prostrado no meu leito, contei todos os minutos até que a minha bexiga se assumiu como séria concorrente (em termos de tamanho) a tão distintos, pesados e grandes objectos como são as bolas de bowling. É verdade, basicamente o que fiz hoje de manhã foi ver quanto tempo aguentava sem urinar. Já do tamanho de um capacete das obras, a bolsa de parede elástica, dotada de uma musculatura lisa, a quem eu chamo de Odete (sim, a minha bexiga chama-se Odete), gritava, ao longo dos corredores do meu aparelho excretor, que assim não podia ser. O intervalo da micção durava já há mais de nove horas e meia. Sendo que a capacidade média da bexiga de um adulto é de meio litro de líquido, é imperativo salientar aqui que a bexiga deste amigo que a vós se dirige assumia volumes na ordem dos 43 litros, capaz de competir, muito bem, com uma qualquer pipa ou tonel das Caves do Vinho do Porto Ramos Pinto.
À medida que o entorpecimento das três pestanas do lado direito do olho esquerdo tomava lugar e as lágrimas escorriam, qual carpideira, verifiquei que o peso das minhas ramelas me impedia de andar direito. Além disso, o cérebro já não dava ordens ao meu corpo ia pa’ três quinze dias. Estava assim desde que vira, pela primeira vez, na íntegra, o Às Duas por Três.
A ida á casa de banho estava próxima, mas antes tinha de enfrentar um problema maior – o de convencer-me a mim próprio que o desafio podia acabar por ali, uma vez que as dores no baixo-ventre e a súbdita vontade de escutar José Alberto Reis eram uma realidade. Havia medo. E sim, mijar os lençóis de urina era algo que não acontecia desde que fizera chichi na cama pela última vez (há dois meses), sendo que até aqui tenho usado fralda de noite por respeito à minha mãe, que me obriga, porque diz que está farta de que os vizinhos do prédio da frente lhe perguntem: “quem é que sofre de incontinência lá em casa?”.
E sim, o desafio foi vencido. A vontade era imensamente grandiosa, mas contive-me até não dar mais. Foi, sem sombra para dúvidas, o desafio mais absurdo e estapafúrdio que alguma vez propus a mim próprio – depois do de escrever isto.

Notas do autor, editor e parvo: Um tonel, na sua capacidade máxima, pode guardar vinte mil litros de líquido. Se calhar exagerei um pouco. Um pouquinho, só.
Quanto aos nomes dos restantes órgãos do meu corpo, passo a citar: coração – Amílcar; fígado – Zé Manel; rins – Jorge (esquerdo) e Manolo (direito); pulmões – Victor (esquerdo) e Alfredo (direito); pâncreas – Tomás; bílis – Amélia; intestino delgado – Artur; intestino grosso – Bud Spencer (é sempre a distribuir…).
[pânico]
O que fui eu dizer?… esta foi, sem dúvida, a pior piada da história da Internet.
[os meus olhos reviram-se agora a uma velocidade excessiva]
Sim, quando finalmente fui à casa de banho para urinar, estive, de acordo com o cronómetro que tenho na casa-de-banho (o que é que faz um cronómetro na casa-de-banho?), trinta e um minutos a urinar. E que bem que soube.

quarta-feira, outubro 26, 2005

Estupidez é fazer um título destes

De interessante nada se passa neste país, por isso temos de pegar em alguma coisa. Nem que seja numa grande e suja cagadela de pássaro, daquelas que nos embeleza a pintura do automóvel e, em tons de esverdeado, contrasta com a cor do nosso bólide. Sim, de facto a palavra “cagadela” foi escrita. Mas também isso não é um mal maior. Um mal maior é, por exemplo, termos um incontinente e senil velho de oitenta e um anos a candidatar-se a presidente da República portuguesa, enquanto que um professor de economia que não consegue comer de boca fechada fala como se tivesse, enquanto discursa, a ser vítima de um exame à próstata através de toque rectal.
Feito que está o infame mas delicioso ataque aos dois prováveis futuros presidentes da República portuguesa (José Cid, onde estás?) debruço-me sobre a estupidez.

[Oh!, frequente hábito. Oh!, vício. Oh!, costumeira abordagem. Oh!, Joana! (ah, isto não era para cantar aqui…) Quando é que eu me vejo livre de ti, ó estupidez?]

Estupidez é chegar ao trabalho com uma hora de atraso, querer trabalhar, e ser constantemente incomodado por um estúpido qualquer que, convencido de que não é zarolho, de que não tem estigmatismo e de que não sofre de miopia, insiste em ler mal um número de telefone e em telefonar para o nosso posto de trabalho a perguntar se é do Talho do Almeida.
Estupidez é a resposta que lhe damos à décima quarta vez que o atendemos.
Estupidez é utilizar expressões como nicles ou patavina para substituir “nada”.
Estupidez é ingerir creme para peles secas.
Estupidez é isto que estão a ler.
Estupidez é ainda acreditar que um dia vamos ganhar o Euromilhões.
Estupidez é ganhar, como já ganhei, um euro numa raspadinha.
Estupidez é tentar descortinar onde é que esta a misericórdia da Santa Casa da Misericórdia.
Estupidez é ouvir Anjos.
Estupidez é viajar no 50 o percurso todo.
Estupidez é chorar enquanto viajamos no 50 o percurso todo.
Estupidez é o pânico que de nós se apodera quando, durante a travessia da 2ª Circular, a bordo do 50, somos conduzidos por um motorista tresloucado que julga que está a competir num campeonato de Fórmula 1, levando o furioso e rectangular autocarro a estúpidas e desaconselhadas velocidades numa estrada que, para além da sua bela sinuosidade, prima pela fácil circulação.
Estupidez é uma fila de urinóis que não são mais do que uma parede com um degrau, num qualquer centro comercial da cidade de Lisboa.
Estupidez é quando, nessa fila de urinóis, escolhemos um mesmo no meio e somos, inevitavelmente, abordados por um estranho que, com tantos postos de evacuação à escolha, escolhe, invariavelmente, o urinol mesmo ao nosso lado, levando-nos a pensar se este quer apenas companhia ou se é o mais recente concorrente do concurso “Compare o tamanho da sua masculinidade, pergunte-nos como”.
Estupidez é, durante a infância, perguntar ao nosso pai o porquê de pequenas e redondas bolas brancas a taparem os buracos dos urinóis.
Estupidez é termos tido a vontade e o desejo de levar algumas dessas pequenas bolas brancas para casa porque ninguém lá no bairro tinha berlindes com aquela categoria, todos branquinhos e tal.
Estupidez é continuar a falar de urinóis.
Estupidez é o que eu fiz no passado Domingo à noite e que vou descrever no próximo parágrafo.
Estupidez é cantar “Dancing Queen” num karaoke.
Estupidez é conhecermos alguém chamado Sebastião e ao lado dele, aos gritos, exclamarmos entusiasmados pela rua fora: - “Ele voltou. Hoje até está nevoeiro e tudo. Ele voltou. El-Rei D. Sebastião voltou!”.
Estupidez é concederem-me este espaço gratuito para dizer estupidez.
Estupidez é termos de dizer “boa tarde” a alguém, quando entramos num estabelecimento qualquer, para nos abrigarmos do brutal e desmedido temporal que está, que nos encharcou de cabeça aos tornozelos (não é “da cabeça aos pés”, para mim é da cabeça aos tornozelos) e que nos estragou o dia.
Estupidez é acordarmos com o som do nosso gato a vomitar.
Estupidez é o Sylvester Stallone querer fazer outro “Rocky”.
Estupidez é ter o nariz a pingar e insistir em limpá-lo com os dedos.
Estupidez é eu ter, agora mesmo, sujado o teclado de ranho.
Estupidez é, quando passamos por uma loja de perfumes e nos dão um bocado de cartão com um perfume qualquer lá borrifado perguntarmos: - “qual é?”, e a empregada da loja, sempre mais maquilhada do que Dee Snider (vocalista dos Twisted Sister), nos responder que é um tipo de papel muito raro, extraído das árvores das florestas tropicais do Kilimanjaro, com um tratamento à base de Casal da Eira e de beringelas.
Estupidez é ainda acreditar que o Pai Natal não existe, só para ser contra esses pais que arruínam o sonho das crianças logo que estas já conseguem encadear um raciocínio lógico-dedutivo.
Estupidez é perguntar a um agente da autoridade (polícia) de trânsito se a faixa vermelha que tem no braço (esquerdo ou direito, não tenho a certeza) com um “T” representa o seu estado de espírito e se esse estado de espírito é “Tarado”.
Estupidez é ele responder-nos que sim.
Estupidez é acreditar que enveredar pela agricultura é abraçar uma carreira de sucesso.
Estupidez é acreditar que, em Portugal, enveredar por qualquer profissão é abraçar uma carreira de sucesso.
Estupidez é quando alguém nos pergunta se o Bob Marley já morreu.
Estupidez é responder-lhe que não e que, inclusive, temos o bilhete para o próximo concerto dele, na Cova da Moura.
Estupidez é eu não conseguir parar de estudar a estupidez.
Estupidez é acreditarem que o que digo é realmente estúpido.
Estupidez é, afinal, o que tenho estado a fazer (Disseram-me agora. Se não mo tivessem dito ainda agora estava a escrever, convicto de que o que digo é realmente estupidez. E é!).
Estupidez é a volta que este último parágrafo deu.
Estupidez é isto.
Estupidez é não saber como acabar este texto.

segunda-feira, outubro 24, 2005

Vai p'ra três quinze dias que não imito morsas

Estava eu aqui a pensar para com o meu fecho-éclair (sim, não sei como é que se escreve, mas julgo ter visto, algures num dos poemas do “Guardador de Rebanhos” de Alberto Caeiro, a palavra “fecho-éclair”, por isso a refiro aqui com tanto entusiasmo, pompa e circunstância). Não foi num poema de Alberto Caeiro? Não? Ah!, então foi na edição da TV 7 Dias da semana passada, na secção de novelas.
Dizia eu: - “estava eu aqui a pensar para com o meu fecho-éclair”, quando fui avassalado por uma sensação de soltura intestinal, pelo que tive de correr rápida, desenfreada e loucamente (e aos gritos, também) para o trono de porcelana. Após 56 minutos de pura descarga, voltei, mais leve 2,4 quilogramas. Mas estava eu a dizer, que estava aqui a pensar para com os meus botões, quando, subitamente, dei conta que afinal até sei fazer uns apartes jeitosos, daqueles que fazem com que a pessoa que lê estas linhas considere que está a ler um romance do Miguel Sousa Tavares, esse guru da boa disposição, uma vez que o mínimo aceitável de páginas para os seus romances é de sete milhões e meio, sendo que o número de capítulos ronda os 893, mais coisa menos coisa.
Venho por este meio manifestar o meu total, óbvio e patente desagrado para com as festas de anos após a verdadeira data de aniversário. Qual de nós já não apagou as velas do bolo (geralmente o mais piroso e descabido bolo alguma vez concebido. Recordo o dia em que fiz oito anos, no qual o meu bolo era um cinto cruzado, de maneira a compor o número oito. Chorei e não comi bolo) quase três meses depois da sua data de aniversário? Ok, nenhum de nós, mas pelo menos quatro ou cinco dias depois de fazer anos já.
E onde é que andam esses génios da confeitaria? Esses seres que, durante as negras e sombrias madrugadas, compõem obras de pastelaria, enquanto riem sarcástica e maleficamente. Esses homens que coçam a herpes com a mão à qual se assoaram três minutos antes. Essas criaturas que amassam a massa já amassada para amassar (chega de trocadilhos) com restos de cascas de tremoços e líquido de refrigeração do motor por debaixo das goivas (não unhas) presentes na pontas dos seus dedos. Essas bestas que não acabaram os estudos na área do Design Gráfico e agora dedicam-se à nobre e conceituada arte da pastelaria, ilustrando bolos de aniversário que, por acaso, até eram para ser saborosos e agradáveis à vista, mas que quando exibidos, provocam em nós náuseas e lancinantes dores na tíbia. (A mim afecta-me mais o perónio, mas isso é a mim… é só para ser diferente).
Mas voltando ao que me trás por cá (que é uma tremenda vontade de “absurdar”). E com este parêntesis acabei de inventar uma palavra e esqueci-me completamente daquilo que ia dizer. Vou ligar para a Cacém Editora –não é só no Porto que há uma editora, no Cacém também há – e propor um dicionário com a palavra “absurdar”. “Absurdar – verbo; acto de dizer ou fazer coisas absurdas”. Que tal, heim?…
[esfreguei violentamente a cara até ficar uma cópia real do Sr. Cabeça de Batata]
Quando estamos a cantar os parabéns, já depois de termos comido quantidade de alimento suficiente capaz de deixar um Tyranossaurus-Rex envergonhado, damos conta de que a pessoa para quem cantamos está com cara de quem precisa de ir à casa de banho e tem vergonha de pedir. Mais. Quando estamos a cantar os parabéns cantamos: - “Parabéns a você, nesta data querida (…)”. Sim, mas geralmente, tal como atrás referi, já passaram quatro ou cinco dias desde o aniversário do indivíduo em questão. Então, que fazer? Imitar babuínos selvagens? O que é que terá então esta data de tão querido ou importante? O facto de nesse dia a pessoa ter sido contemplada com uma agradável e simpática colibacilose? Não, parece-me que não.
E tu? Já lavaste os dentes hoje?

sábado, outubro 22, 2005

Tu, Eco e Gipsy Kings ao pé coxinho: a vida numa folha A1

Daqueles dias em que mais valia sair à rua e pôr-me debaixo de uma bicicleta. Ficava só com uma nódoa negra. Uma nódoa negra e uma naifada no baço chegavam-me para ver se começava a pensar noutra coisa. Se começava a ter paciência para ler o texto do Eco para Semiologia. Qualquer coisa do vestir. Ou do despir. Também não quero saber as respostas para as perguntas da Humanidade (nada disso) só não quero fazer figura de urso. Urso, mesmo. Mas os ursos e as figuras existem e ninguém tem culpa disso. Às vezes há coisas que simplesmente não dão. Nem cabem numa folha A1, felizmente.


Só me falta ouvir os Gipsy Kings em estéreo, dançar êxitos da Eurovisão, descer a Rua Garret ao pé coxinho e deixar de pensar sempre no mesmo se não houver outra saída. E depois, deixar de escrever coisas sem sentido.

quinta-feira, outubro 20, 2005

Não chamarei a isto "1984" porque houve um gajo que já o fez quando intitulou um filme seu

Este era para ser um texto dedicado integralmente a uma dúvida que me invadiu (felizmente não entrou por locais que não quero mencionar aqui para não ferir susceptibilidades) estava eu a beber um iogurte líquido e a pintar uma tela a óleo com os pés. Não o farei porque, de facto, já me esqueci completamente do conteúdo dessa interrogação, pelo que o mero enchimento de linhas é agora a única alternativa para uma missiva que, antes da sua formulação, perfilava-se como sendo uma verdadeira jóia da literatura do nosso Portugal e da Mauritânia. Mas como na Mauritânia não conseguem ler isto porque estão demasiado ocupados com o lançamento do filme “Rei Leão 46 – Simba pôs uma dentadura nova e comeu, de uma vez só, três anciães da aldeia”, espero que, em Portugal, leiam aquele que é o octogésimo quarto post do Primavera no Chumbo do Matraquilho e, também, a sua consequente e absurda comemoração.
Poderão vocês, milhares de leitores, [prush…. – onomatopeia que traduz o colapso neurónico e vesicular (é, o meu cérebro mantém estritas relações com a minha vesícula) que se deu quando constatei que proferi tamanha estupidez relativamente ao número de seres humanos e musaranhos que lêem este blog] interrogarem-se: “Então mas não devia ser no post 100 que eles deviam comemorar? Mas que raio!”. E agora, se fazem o favor, perguntam mesmo isto. Onde quer que estejam, quer estejam a fazer cocó quer estejam a abrir uma lata de sardinhas em conserva para comerem com esparguete, façam o favor de perguntarem em voz alta o que acabaram de ler entre-aspas. Ah, pois, ninguém lê isto na sanita. É mais provável que quem lê isto tenha de ir a correr para a sanita, isso sim. Eu corro para lá, sim, mas é porque o mover das águas do autoclismo desperta em mim sensações de arrepio e entorpecimento das pestanas e a inércia toma conta de mim durante 39,25 minutos. Não há sensação mais libertadora. Quer dizer, há, mas não me apetece dizer qual é porque não a sei.
Vá… não ouço nada. Têm vergonha que alguém vos ouça, é? Eu nem pedi para gritarem. [isto é que é interacção…] e que tal se agora coçassem frenética e estupidamente, com o dedo mindinho, o interior do vosso pavilhão auditivo? Estou a fazer isso agora mesmo (acreditem ou não, eu não minto!) com a mão direita, enquanto que com a esquerda escrevo no negro e ergonómico teclado diante de mim. Verdade. Verdade é também que vou agora encerar a pintura do meu carro, pois a extracção de cera do meu ouvido direito dá para isso e ainda para eu celebrar um contracto lá com os senhores que fazem aquelas velas que pesam toneladas para os peregrinos levarem a Fátima. …já venho.
De facto, o número 84 tem grande significado para a minha pessoa e para muitas outras pessoas, mas o que interessa aqui agora é que tem significado para mim. Primeiro, porque foi no ano 84 do século vinte que este obtuso e inepto Adónis que vos escreve foi concebido e nasceu. É verdade, com isto acabei de revelar que tenho 34 anos. (E sim, também acabei de revelar que não sou muito bom a Matemática e que se continuo a empregar expressões destas habilito-me a ser nomeado "Imbecil que, a par do stress, café e tabaco, é a principal causa de enfartes do miocárdio em Portugal").
Em segundo lugar, é de realçar a tremenda importância que a década de oitenta, particularmente este ano, teve no mundo. Acontecimentos como… pá, não sei mesmo o que é que aconteceu de importante nesse ano, mas sei que faltavam dois anos para a adesão de Portugal à União Europeia e que Madonna lançava “Like a Virgin” (lançava literalmente, pois conheço alguém que conhece fulano que foi atingido por uma caixa do CD e que ainda hoje anda em tratamentos, pois aquilo vazou-lhe uma vista).
E eu solto um desesperado carpido, uma vez que tudo isto foi estúpido.

segunda-feira, outubro 17, 2005

[Aos gritos quase roucos e nove oitavas acima do timbre normal de qualquer ser humano] SAI DA CHUVA OU AINDA TE CONSTIIIIIIIIIIIIIPAS!

É verdade. Se ficarmos à chuva ainda nos constipamos. Ou então corremos o risco de sermos mortalmente trucidados por uma serra eléctrica, dessas que se passeiam pelas ruas do Rossio sem destino e cujo único objectivo é cortar cabeças (de nabo?). Mas não é de bricolage que vos venho falar hoje. Dirijo-me a vós com o intuito de… pá, não sei, já estou à algum tempo a tentar formular esta frase e nada me ocorreu por isso ficamos por aqui.
Furacões e seus derivados. A minha solidariedade vai para com as vítimas desses furacões.
No entanto, não posso deixar transparecer a minha indignação, uma vez mais, para com esses brutos, esses insensíveis rudes que ao menos podiam fazer um inventário das coisas que vão destruir. Ao menos faziam um orçamento. Vinha de lá um senhor com um bigode farfalhudo (daqueles capazes de esconder um garrafão-de-cinco-litros-de-vinho-tinto-dos-mais-rançosos-que-há-lá-dentro-juntamente-com-as-cascas-de-tremoços-ali-alojadas-há-mais-de-ano-e-meio) e uma profusa e proeminente barriga, com um lápes do tamanho de um átomo e um bloco de notas com a Cláudia Schiffer na capa e dizia, com uma saloia voz catarral: - “ora munto baim, bamosh lá a bêr no qué quisto dá. Dej euritos e num she fala mái nixo”. E, após o orçamento que durava, aproximadamente, sete segundos e meio, o shôre ia-se embora à vidinha dele porque ainda tinha de ir fazer uns orçamentos de uns terroristas que iam explodir uma retrosaria ali para os lados da Ajuda – isto porque a senhora que lhes vendeu linhas para os detonadores das bombas denunciou-os, devido ao alto teor a caril que estes exalavam, à Inspecção Geral do Trabalho e ao Ministério das Finanças e agora eles têm de declarar os rolos de nylon e os novelos de lã vermelha (estes últimos comprados ao preço da chuva, para fazerem umas camisolinhas de malha para não terem frio na hora de se rebentarem todos) que adquiriram. Sim, para quem não sabe, à parte do terrorismo, a grande arte do muçulmano-doido-que-pensa-que-por-se-despedaçar-tem-hipóteses-contra-setenta-virgens é a criação de peças de roupa de malha e a costura. Setenta virgens? Ah… nem morto!
(E esta piada, ah? “nem morto”… setenta virgens, depois de se rebentar morre… “nem morto”… ah? Que tal?) … snif.
[diagnóstico: lágrimas, lábio inferior treme, convulsões e dores lacerantes na falangeta do mindinho direito]
É verdade. Este foi o “aparte” mais longo da minha vida. E sim, eu estava a falar de furacões.
É certo que com este elevado número de furacões temos material novelístico (a nível de personagens – o Rita, o Katrina e esses todos que agora não me lembro o nome) para iniciar uma novela que destronará toda e qualquer programação televisiva. A TVI já está no encalço da produção dos furacões (até à data sem contactos bem sucedidos, uma vez que a produção está bem lá em cima…) – [piada parva] – para fazer uma novela com esses vórtices cujo único medo que têm é de serem, depois do estrelato* alcançado, convidados para o programa do Goucha.
De facto, essas bestas que têm na identificação sexual a sua maior dúvida não nos deixam sossegados. Sim, ou será o que o furacão Rita não se devia chamar “furacão Rito”? E o Katrina? É impressão minha ou esse devia chamar-se “Katrino”. É que, ou muito me engano, ou estes são furacões que recorrem ao transformismo para actuarem e ainda estão na fase da indecisão. Caramba pá, um pouquinho de decência, se fazem favor, ó furacões. Agasalhem-se, porque está um temporal desgraçado por onde vocês andam, vistam uma calça de ganga e um blazer e por mim tudo bem. Agora andarem aí com saias travadas e top’s. Com franqueza. É que ainda se constipam.

*“Estrelato” – palavra estúpida que não consta no dicionário mas que continua a ser utilizada por jornalistas, comentadores, políticos e por mim.

P.S. – É a primeira vez que recorro a um asterisco no meio de um texto e a primeira vez, também, que utilizo um post scriptum. Razão para felicidade ou mera parvoíce?

sábado, outubro 15, 2005

Provérbios ao Quilómetro #1

"Corre! Corre que vem aí a tua avó com uma faca para te matar!"
in O Pantagruel dos Provérbios





pelo sim pelo não, procurem um colete de campino debaixo da cama e escondam os pertences numa caixa madre-pérola. Adeus.

quinta-feira, outubro 13, 2005

Certo passarinho disse-me que estou senil

Foi-me incumbida, pelo meu estouvado, inquieto e parvo sistema nervoso central, a empreitada literária e linguística de pensar (ok, não é bem pensar, é mais… não sei o que é, mas pensar não é de certeza) em muita coisa. É, ao fim de 43 palavras e 10 sinais de pontuação gráfica, não fui capaz de dizer absolutamente nada passível de acrescentar saber às mentes que lêem esta coisa chamada texto. E com o “É” com que iniciei o período passado tive a nítida sensação de me estar a metamorfosear numa Manuela Moura Guedes – volta e meia (porquê ‘volta e meia’ e não ‘volta e peúga’?) a senhora atrás citada solta uns “É” durante a sequência informativa por ela proferida, no meio dos outros guturais sons emitidos pela sua (não sua, dela) larga e colossal caverna bocal.
A gripe das aves está aí. Poupas (ou ‘O Passarão’ para os que gostam das deprimentes traduções brasileiras com que fomos bombardeados aquando da nossa meninice), a Águia Vitória e o Pato Donald já prometeram manifestações em frente do Ministério da Saúde. O grande pássaro amarelo, presidente do SNEI,QDORDGPSOSCASML,

PARSDAAPGMEDQHMEQJMBPEQEPATNE (Sindicato Nacional E Internacional, Que Detém O Recorde Do Guiness Por Ser O Sindicato Com A Sigla Mais Longa, Para A Reinserção Social Das Aves Afectadas Pela Gripe Mais Estúpida De Que Há Memória E Que Já Matou Bastantes Pessoas E Que Está Prestes A Tornar-se Numa Epidemia), já fez saber que tem o apoio do Conde de Contar, de João Soares e do Bacalhau Pascoal na luta contra a discriminação dos patos e gansos residentes nos jardins de Belém e dos estúpidos pavões que alegremente vagueiam pelo Jardim da Estrela.
Poupas disse, com voz fininha, tão-somente isto­: “Então os humanos são vacinados e nós, que estamos aqui a espirrar e a tossir que nem parvos, não temos direito sequer a uma canjinha?”. A Galinha dos Ovos de Ouro ouviu as suas (suas não, dele… gosto tanto de fazer este trocadilho) declarações e castigou Poupas, uma vez que este não tem em consideração as galinhas que são assassinadas, esquartejadas, degoladas, trucidadas e outras coisas que tais acabadas em “adas” diariamente para se fazerem canjas. O animal que caga ovos dourados tratou, desta vez, de subir a uma árvore, esperar que Poupas adormecesse debaixo da mesma, e defecar uma bigorna de ouro puro de cinquenta quilogramas em cima da cabeça do desgraçado. “Assim esse pássaro amarelo que sofre de gigantismo e tem a mania que é sabichão aprende a nunca mais gozar com as galinhas”, disse a Galinha dos Ovos de Ouro.
O problema é se alguma ave estiver em contacto com um animal hospedeiro da doença. Aí é que está o problema. Solução: periquitos, papagaios, canários, patos-reais, patos-bravos, gansos, pintassilgos, águias, falcões, abutres, gaivotas, rôlas e pombos que me lêem, não andem de avião porque os hospedeiros podem estar engripados.
O que me intriga é se, no futuro, além da Gripe das Aves, também seremos confrontados com a Tuberculose dos Hamsters, a Esclerose Múltipla dos Porcos, a Gonorreia das Tartarugas e a Alzheimer das Iguanas. Aí, bem, aí estamos feitos ao bife.
Expliquem-me, por favor expliquem-me, donde provém tamanha aberração linguística: “feito ao bife”. O que é isto? Significa que, quando uma pessoa está feita ao bife, está a cortejar um naco na pedra? Estará o ser humano a mandar piropos para um bife da vazia mal-passado? Quer isto dizer que o estado natural das pessoas, em geral, é a passagem não para um estado ‘Zen’ mas sim para um estado ‘Grill’?… meu Deus.
[esta foi, de facto, uma das piadas mais lerdas, estúpidas, broncas, tapadas e obtusas que alguma vez concebi. Outrora ‘prenho’ de piadas genialmente dignas de uma estátua de marfim barato em frente à sede da NATO, limito-me agora à estupidez a mim inerente e profiro isto]

Misericórdia.

segunda-feira, outubro 10, 2005

Rrrrrrrespeitável público... vou beber um sumo de cenoura.

Não, não vou escrever sobre as eleições autárquicas de ontem. Não, também não vou escrever sobre Economia dos Recursos Humanos e não, também não me passa pela cabeça abordar a polémica em torno da expressão portuguesa ‘sufrágio’. Apre, que é uma expressão estúpida!
Vou, isso sim, encher-me de coragem e procurar dar uso à minha nobre e incrível capacidade de não dizer nada de jeito. Catita, ãh?
Se há uma coisa que me inquieta, além de saber que respiro o mesmo ar que Isaltino Morais, essa coisa é a cueca a apertar o rabo. Sim, é verdade. Porém, é melhor ignorar esse facto, porque ninguém quer saber se a roupa interior que uso me aperta os glúteos.
Ok, eu não resisto… é mais forte do que eu. A política é agora um tema a abordar. Eu prometi que não, mas depois disto prometo que procederei ao visionamento de K7’s dos Amigos do Gaspar durante quatro horas como acto de auto-flagelação.
O circo chegou a Portugal e teve ontem o seu apogeu artístico. Os actores circenses reuniram-se em praça pública e exibiram dotes nunca antes vistos pelo povo português.
João Soares – Magníficoooooo. Cuidado. [onde quer que estejam chamem o Sr. Cardinalli que anuncia os artistas ao microfone] É verdade, Soares Jr. é o único trapezista mundial (supera todos os outros trapezistas sul-americanos cujo primeiro nome é ‘Maxi’) a conseguir dois “mortais-encarpados” num espaço de oito anos, com um intervalo de quatro anos.
Avelino Ferreira Torres – O maior génio ilusionista, qual Houdini qual Copperfield, que pisou as pedras da calçada portuguesas até hoje. Digno de jogos de palavras que envergonhariam Fernando Pessoa e seus conterrâneos da geração de Orpheu, Ferreira Torres é possuidor de uma linguagem encantadora.
Isaltino Morais – Palavras para quê?
Era fácil (não, não era nada fácil, eu é que estou a dizer que era fácil porque fica bem começar assim um parágrafo) continuar a falar destes artistas, mas o que é certo é que falta-me a camelice necessária para prosseguir com esta epopeia literária.
Às eleições autárquicas junta-se um pouco de parvoíce e uma pitada de orégos e o caminho para Oz é uma realidade. (Ok, 'pitada' é um termo que me assusta. Ainda hoje me sinto apavorado quando escuto Chefe Silva ou Chefe Capote a dizerem essa palavra com um cutelo na mão). Não que já não haja esse caminho em Lisboa para uma cidade fantástica (Felgueiras?), uma vez que continuo a achar que Carmona é o espantalho dessa odisseia.

Conclusão: a chuva parou, o sol já brilha e vou lavar os pés.

sexta-feira, outubro 07, 2005

Estupidez proverbial aguda

Iniciar uma odisseia de escrita sem rigorosamente assunto nenhum para escrever é deveras incomodativo. É que dá assim aquela sensação de aperto intestinal. Parece que tenho um espartilho vestido e que não o quero tirar. Parece que calcei uns sapatos de salto alto e estou a correr desenfreadamente pelas ruas de Alfama. Parece que… não, não parece nada. Já chega de alusões a roupa feminina porque não a visto… ao de semana.
Cheguei à conclusão de que quando a inspiração não vem até nós, temos nós de ir até ela, porque senão também morríamos, porque sem inspiração os pulmões não recebem oxigénio.
Após algo que espero que apaguem da vossa memória a curto prazo, passo a citar alguns provérbios que me têm causado alguma espécie e me suscitam a indagação: “será que quem os inventou sofria de estigmatismo intestinal?” (foi a doença mais estúpida que ocorreu no momento).
- “Se o Maomé não vai à montanha, a montanha vai até Maomé”. Proponho uma reformulação deste dito que para mim é tão estúpido como pensar que Maria José Nogueira Pinto será Presidente da Câmara de Lisboa. E eu penso.
Para mim é: “Se o Maomé não vai à montanha é porque o 50 não passa lá”.
- “Todos os caminhos vão dar a Roma”. Não vão nada. Olha, olha, era o que faltava.
A versão correcta é: “Todos os caminhos vão dar ao destino deles mesmos e não, não vão dar a Roma porque o 50 não passa lá”.
- “Entre marido e mulher ninguém mete a colher”. Mas que raio! A que propósito é que tiveram a esdrúxula ideia de meter uma colher entre um casal?
Versão correcta: “Entre marido e mulher ninguém mete um conjunto de chávenas inglesas com pega em ouro, porque o 50 não passa lá”.
- “A galinha da minha vizinha é mais gorda que a minha”.
Versão revisada: “A minha vizinha é mais gorda do que eu”.
- “Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és”. Não. Isso é parvo.
Alternativa: “Diz-me com quem andas e se for com chungosos arrisco-me a dizer que és um chungoso”.
- “O bom vinho por si fala”. Fala? Cá para mim quem teve esta ideia peregrina já estava com uma broa de todo o tamanho.
Deve ser assim: “O bom vinho até estala”.
- “Para grandes males, grandes remédios”. Significa que quando alguém apanha uma grave doença venérea tem de tomar comprimidos de 5 kg? Ou tem de pôr supositórios para cavalos? Na.
Cá p’ra mim é assim: “Para grandes males é melhor preparares-te para desembolsar muito euro porque os medicamentos estão caros”.
- “Mais depressa se apanha um mentiroso que um coxo”. Sim, de certa forma, tendo em conta que todos os mentirosos coxeiam.
Eu proponho: “Mais depressa se apanha um mentiroso se ele for coxo, for de 50 e nós de carro”.
- “Por fora cordas de viola, por dentro pão bolorento”. Pá, o que é isto?!
Concluo, com isto, que olhar directamente para eclipses sem aqueles óculos pirosos faz mal. Pois, eu olhei. Foi uma chatice porque sujei-me todo e a minha mãe deu-me um estalo quando cheguei a casa e não me deixou comer sobremesa.

Não fiquei cego, mas borrei-me todo.

segunda-feira, outubro 03, 2005

Olhe, depois da lobotomia traga-me uma costeleta de novilho, por favor. Bem passada.

Fui ao cabeleireiro.
Qual de nós nunca foi? Tony Ramos nunca foi.
Narro aqui a experiência, revestida de abundante parvoeira e de muita sujidade na parte traseira da roupa interior por mim trajada nesse dia, mas deixemos isso.
Após quase uma hora de ansiosa espera, durante a qual contei as linhas que identificam as minhas impressões digitais e medi o perímetro do espaço comercial no qual me encontrava com um pau de fósforo, chamaram-me. (Pronto, ok, não consegui medir o perímetro do espaço comercial. Mas contei as linhas todas das minhas impressões digitais. São umas quantas.).
Sentei-me numa cadeira e uma senhora aproximou-se, muito simpática, perguntando como é que ia ser. Eu disse-lhe que estava capaz de comer uma costeleta de novilho, grelhada, com muita batata frita e um arrozinho branco a acompanhar. Ela deu um impetuoso grito de fúria e disse: - “A minha colega já o atende”.
Fui enviado, como castigo, para uma cadeira estranha, e por momentos vi-me numa consulta de ginecologia, uma vez que aquela cadeira tem, tal e qual, o formato e o grau de inclinação de uma daquelas sombrias e escuras poltronas que equipam o consultório dos senhores doutores que utilizam o relógio entre o cotovelo e o ombro.
Dei por mim com alguém a lavar-me a cabeça e a descobrir, aos gritos, que afinal há mais variantes de dermatite seborreica do que aquelas que são conhecidas. Ao mesmo tempo nevava.
Enquanto me esfregavam sôfrega e violentamente a cabeça, fui cegado por dezenas de minúsculas lâmpadas incandescentes colocadas estrategicamente no tecto do salão. A sua luz, brilhante e convidativa, rasgou-me a córnea de alto a baixo e por momentos senti-me incapacitado mentalmente.
[A verificação ortográfica do processador de texto que utilizo aconselhou-me a ponderar a substituição do conjunto frásico “senti-me incapacitado mentalmente” por “sou e sinto-me incapacitado mentalmente”]
Após a lavagem, a senhora que a consumou esfregou-me a cabeça com violência tal que hoje à tarde vou tirar os pontos resultantes das lacerações provocadas por uma simples toalha.
Cortaram-me o cabelo. Devo dizer que foi a parte menos custosa, embora a mais longa, de todo o processo. Quando pensava que nada mais tenebroso poderia acontecer, eis que ouço: - “Vamos lavar?”.
Rapidamente senti-me invadido pelo desejo de gritar “Água fria da ribeira (…)” e de procurar tudo o que fosse roupa branca ali presente, mas esbofeteei-me três vezes e borrifei a cara com pó de talco fora da validade e passou-me essa vontade.
De volta à cadeira do horror, e após nova e penosa lavagem, durante a qual chorei por não conseguir ver sequer a escuridão, vi um instrumento que me meteu medo. Pensei para comigo: - “Egas Moniz ditou o meu fim. A excisão profunda do meu lobo pré-frontal é uma realidade
”. A lobotomia estava próxima. O suor frio escorria, misturado com os cerca de 2,15 quilogramas de champô que me cobriam o espaço capilar. Ainda pedi anestesia, mas não obtive resposta. Não. Não me iam invadir o cérebro (ou o que resta dele). Iam, isso sim, massajar-me o couro cabeludo. Ainda hoje me questiono sobre qual o local onde arranjaram aquela peça. É que ou muito me engano ou não senti sequer uma comichãozita. Será que a compraram numa das 796.482.351 lojas de chineses que há (só) em Lisboa? Provável.
Provável é eu ser linchado em praça pública quando este texto for lido, mas não faz mal.

Momento Letras de Músicas #6 / Inquieto...


Inquietação

A contas com o bem que tu me fazes
A contas com o mal por que passei
Com tantas guerras que travei
Já não sei fazer as pazes

São flores aos milhões entre ruínas
Meu peito feito campo de batalha
Cada alvorada que me ensinas
Oiro em pó que o vento espalha

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está p’ra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Ensinas-me fazer tantas perguntas
Na volta das respostas que eu trazia
Quantas promessas eu faria
Se as cumprisse todas juntas

Não largues esta mão no torvelinho
Pois falta sempre pouco para chegar
Eu não meti o barco ao mar
P’ra ficar pelo caminho

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que está p’ra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda

Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Mas sei
É que não sei ainda

Há sempre qualquer coisa que eu tenho que fazer
Qualquer coisa que eu devia resolver
Porquê, não sei
Mas sei
Que essa coisa é que é linda

-José Mário Branco- (ouço a versão feita pelo JP Simões e pelo Miguel Nogueira)

De vez em quando isto acontece: apanhamos e somos apanhados por uma canção no momento certo. Diz tudo e ainda pode dizer mais. Por agora fica assim...a sentir cá dentro A inquietação...tão familiar.
(o clima de loucura será retomado em breve...pedimos desculpa pela interrupção)